Análise: Pazolini rompe com a ponte que o ligava à direita — e pode afundar em sua própria ilha

O secretário de Governo de Vitória, Erick Musso, ainda permanece no cargo, mas sua exoneração já está definida nos bastidores. A saída será discreta, sem pronunciamentos públicos, sem entrevistas ou notas de agradecimento — apenas um comunicado técnico, provavelmente atribuindo sua desvinculação à necessidade de fortalecer o partido e articular alianças para 2026.
A decisão ocorre menos de quatro meses após sua nomeação, marcada por grande expectativa política. Musso foi recebido com prestígio e respaldo, com participação ativa na montagem da estrutura administrativa e influência direta na escolha da vice-prefeita. No entanto, a curta duração de sua permanência evidencia um ambiente de instabilidade política interna.
Apesar da justificativa genérica que será apresentada, o contexto sugere outra leitura. Musso, que chegou à gestão com influência, foi gradualmente esvaziado politicamente. O espaço inicialmente concedido foi substituído por um processo silencioso de exclusão, sinalizando um modelo de governança centralizador, no qual o compartilhamento de poder ocorre apenas por conveniência e de forma rápida.
A gestão Pazolini tem demonstrado um padrão de relacionamento político baseado em vínculos temporários e rupturas estratégicas. Casos anteriores reforçam essa linha de conduta: o senador Magno Malta, o ex-candidato Carlos Manato e o deputado Capitão Assumção, todos ligados à direita capixaba, também foram afastados ou ignorados.
Magno Malta foi o responsável por lançar Lorenzo Pazolini na política, oferecendo-lhe orientação e a legenda para disputar o cargo de deputado. Pouco tempo depois, a criatura descartou o criador.
Em 2022, no segundo turno da disputa pelo governo do Estado, Pazolini optou pela neutralidade, recusando-se a apoiar Carlos Manato, principal nome da direita capixaba na oposição a Renato Casagrande. Além disso, foi a partir de uma denúncia eleitoral ligada ao grupo de Pazolini que se desencadeou uma operação policial na residência do deputado Capitão Assumção, em plena campanha eleitoral.
Em resumo, os três principais representantes do bolsonarismo no Espírito Santo — Magno, Manato e Assumção — foram alijados, em momentos distintos, por um mesmo movimento político: o de Pazolini.
No aspecto ideológico, o histórico recente mostra uma guinada que não se sustenta no tempo. Durante a campanha de 2020, Pazolini se posicionou de forma equidistante entre Lula e Bolsonaro, classificando ambos como radicais. O alinhamento com pautas conservadoras surgiu apenas em 2025.
Ao longo dos últimos anos, não houve manifestações públicas em defesa das principais bandeiras do eleitorado conservador. Nenhuma crítica às decisões judiciais que cassam conservadores, nenhuma solidariedade aos presos políticos capixabas, nenhuma participação em manifestações da direita e nenhuma declaração de apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro, nem mesmo durante suas visitas ao Espírito Santo.
Já nos últimos meses, o prefeito passou a se pronunciar em defesa da liberdade de expressão e da anistia aos envolvidos no 8 de janeiro, sinalizando aproximação com o bolsonarismo. A mudança, entretanto, é interpretada por analistas como estratégica, tardia e apenas midiática.
Como destacou o deputado Capitão Assumção: “Pazolini nunca participou de um movimento conservador. Nunca levantou a bandeira bolsonarista. É uma falsa direita.” A expressão “transdireita”, também dita por Assumção, descreve esse tipo de adaptação ideológica que muda conforme a conjuntura política.
Embora a administração municipal apresente entregas relevantes, o reposicionamento ideológico de última hora levanta questionamentos sobre autenticidade. A construção de imagem ideológica baseada em conveniência pode gerar desgaste em um cenário eleitoral cada vez mais atento à coerência de trajetórias políticas.
A saída de Musso rompe a principal ponte institucional com a direita capixaba. Com a possível federalização do Republicanos e a indefinição sobre o controle da legenda no Espírito Santo, Pazolini corre o risco de ficar sem partido, sem base política e sem identificação clara junto ao eleitorado conservador.
Na política, a simulação ideológica tende a ser mais custosa do que o erro estratégico. A tentativa de incorporar um perfil que não se sustenta no histórico pode ser pior do que ser dito de terceira via — nem esquerda, nem direita.
Lorenzo Pazolini, cercado pelas escolhas que fez, pode ver sua própria ilha tornar-se intransitável. E ilhas assim, mesmo sem maré alta, tendem a afundar sozinhas.
COMENTÁRIOS